Olá meus Irmãos! Bora pra mais um Papo de Terreiro? E o assunto agora é:
Terreiros do Brasil no processo
histórico da tradição e da modernidade:
a sociedade brasileira, os anagonus,
suas crenças e costumes.
por: Celso Ricardo Monteiro
As religiões de matrizes
africanas trazidas para o Brasil em meio ao processo escravocrata trouxeram
contigo um largo histórico cultural, vivenciado pelos diversos povos que em
comum, possuem o berço. No que tange os seguidores de Orixá, o bem estar social
está associado ao como os indivíduos se posicionam neste mundo em que eles
vivem, de acordo com os dogmas e cultura de suas tradições. Para tanto, é comum
o uso de oferendas ritualísticas, usadas para garantir o equilíbrio do homem e
da sociedade humana, além do bem estar social, a fertilidade, sustentabilidade
política e outros avanços da sociedade africana, que garantiriam mais tarde,
melhor qualidade de vida para tais povos na terra mãe ou em espaços outros,
para os quais foram sequestrados.
Quando falamos de tal seguimento,
acredita a sociedade brasileira que estamos nos referindo apenas à uma fusão de
comunidades-nações e civilizações africanas que se transformaram no tal
Candomblé brasileiro praticado no sudeste do Brasil. Tamanho engano, permite
que estudos sejam feitos ao longo dos anos e, comprove que aqui há a existência
de inúmeras religiões oriundas da África e, esta diversidade cultural
religiosa, aqui existente aparece na historia do Brasil como prova, de como
tais civilizações foram extraídas de sua terra de origem e mantida noutros
territórios. Mais que isso, o candomblé e as tradições co-irmãs não são apenas
religiões, mas sim, universos coletivos, onde a vivência pauta-se pelo conjunto
de códigos e valores que orientam a vida das pessoas, a partir de seus
ancestrais. Aqui, a fé é um entre os vários elementos que determinam o bom
andamento e a conduta dos sujeitos.
A crendice e imposição dos
senhores feudais imperaram e, agruparam diferentes povos num único espaço, sem
contudo considerar a diversidade de hábitos e costumes tradicionais, mais tarde
alterados pelo processo histórico. Mais isso não foi suficiente para eliminar a
civilização dos “anagonus.”
Para o grupo dominante um
problema: conciliar dialetos, culturas, valores e outras diferenças, extraídas
do Golfo da Guiné, Sul da África, Dahomé, Benin, Ijebú, Congo, Cabila, Ile-Ifé
e tantas outras regiões africanas, cujo reinado acontecia a partir de sistemas
diferenciados, fato este, que deveria no caso da cidade vassala de Oyó,
considerar a Dinastia Monarca da família real, onde o Aláfin e outros homens
daquela cidade, utilizavam-se do casamento simultâneo, considerado crime no
Brasil. Como Reis, Rainhas, Sacerdotes e demais lideranças, acompanhados de
seus pares, foram seqüestrados e tratados como “lixo” não foi considerando
importante é óbvio, em momento algum da história, as especificidades de tais
povos, nem tão pouco sua fé ou crença e cultura, que como querem alguns “gurus
da academia” hoje estão necessariamente ligados a um sistema religioso. Um
exemplo é o culto aos ancestrais, proferidos em toda África, com formato,
rituais, valores e motivos diferenciados, não afirmando um consenso
obrigatório, porém todos com fundamentação, origem e jeito de ser.
Mesmo que com alguns conflitos
aqui reproduzidos, Iyá Kalá, Iyá Adetá e Iyá Nassô reproduziram com excelência
o culto a seus antepassados em solo brasileiro, assim foi também com o culto as
demais divindades do povo negro-africano.
Para nós pesquisadores de África,
isto significa uma das maiores vitórias daquele povo, que conseguiram ao longo
dos tempos, assegurar e noutro momento histórico, fazer ressurgir o que sua
terra de origem tem de mais forte e real, pois pouco a pouco, as divindades da
caça, da pesca, da agricultura, da fertilidade, etc, foram ganhando espaço no
território brasileiro, mesmo com a ocorrência de mortes significativas e como
na África, o Culto de Orixá foi se fortalecendo familiarmente através da
oralidade tão usado por seus clãs, com toda a sua adversidade.
Com o tempo, o sincretismo como
metodologia utilizada para “salvação de tais cultos ritualísticos”, foi
popularizando e aproximando tais religiões da população ou vice versa. A
auto-identidade foi se afirmando junto á chamada consciência negra e tanto às voltas
da Costa Marítima, como nos centros urbanos, as religiões de matrizes africanas
foram fincando raízes e escrevendo sua historia, apoiadas em suas mitologias,
tecnologias, culturas e ritualísticas.
E como não podia deixar de ser, o
equilíbrio foi se instaurando entre os diferentes povos, resultado este do
autocuidado individual, no que se considera a sua religação com divindades
inúmeras, através dos métodos hoje chamados por alguns de “tradicionistas”.
O respeito ao outro, a formação
cultural a partir dos valores étnicos, a comunhão e tantos outros valores,
foram fortificando a essência humana, que o povo iorubá entre outros, mantém
através de suas práticas religiosas, ainda na nova era. O auto respeito, o
autocuidado, o diálogo, a hierarquia e posteriormente a reforma tradicionalista
(voluntária), juntou estas tradições à realidade burguesa-ocidental, e
implementada no Brasil de costumes indígenas. Isto fortificou a necessidade do
cuidado para com o outro, lição, mais tarde, reaprendida com a epidemia de
Aids, que trazia nos anos oitenta, a tarefa de dar atenção básica a pessoas
acometidas por um mal que ninguém conhecia.
No Brasil atual o quadro pede
formulação e implementação de políticas públicas, levando-nos para o diálogo
com uma elite, que não conhecia nada disso no início do século vinte, mas que
agora, ocupa espaços consagrados na comunidade internacional.
Esta mistura étnico-cultural que
permite também a presença do cristianismo (imposto), deu vez à reforma das
práticas, das disciplinas, do convívio e do diálogo pacífico com os diferentes,
hoje reproduzidos nas atividades inter-religiosas que tanto colaboramos ou
protagonizamos. Essa se transformou em uma das questões mais presentes entre o
povo de santo, o que significa na prática, muito debate e ausência de consenso,
dada as diferenças políticas, geracionais e culturais que norteiam estas
relações.
Novos tempos foram ganhando suas
vezes. Tempos de Procópio, Aninha, Mãe Menininha do Gantóis, Moriçoca, Goméia,
Zé de Obakosso, Gaiaku Luiza, Luiz de Jágun, Estela Odekaiyode, Caio Aranha
Obainan e tantos outros ícones, que acrescentaram e muito na historia do povo
afro-brasileiro, considerando sua qualidade de vida e desenvolvimento humano.
Mas, agora é a vez da juventude que compõem este universo.
Ao processo contínuo de
readaptação, agora, é a globalização, “filha mais nova” do sistema, no Brasil
pós-colônia e, tantos outros fatos ou momentos políticos, que ameaçam a
tradição e as religiões hoje afro-brasileiras, incentivando a incorporação de novas
praticas que podem ou não, a depender do ponto de vista, ferir a essência ou
afetar a eficácia de segredos e espaços sagrados destes povos, configurando aí
um novo desafio aos novos e antigos atores, que simultaneamente, tentam driblar
a ingerência dos opositores, diante novamente da necessidade de uma estratégia
de salvação, agora ainda mais eficaz, mas muito próximo do mercantilismo,
individualismo e brigas por posse ou poder.
É como se as mesmas diferenças
existentes na África (sociais, políticas por vezes partidárias, climáticas,
regionais, revolucionárias, etc…), fossem uma constante também no Brasil,
vistas por muitos como algo responsável pela transformação de tais religiões,
hoje associadas á nova geração de sacerdotes e sacerdotisas, que deixam para
trás, através da morte de seus genitores e mestres, algumas práticas e
conhecimentos, dando vez a uma nova forma de se religar á Deus, nem sempre
compreendida pelos mais antigos, mas interpretada como processo natural do novo
mundo ocidental, que deve reciclar e democratizar tudo, sempre. Ainda assim,
existem os grupos conservadores mesmo que composto por alguns jovens, que não
compartilham das mudanças na totalidade.
Vale também a informação que
segue: os anos oitenta e noventa, permitiram uma outra readaptação destes
povos, que deixavam para traz o regime hierárquico ditatorial, praticado pelos
mais velhos e, passam a dar oportunidades para um sistema facilitador nas
articulações internas dos espaços religiosos, permitindo que o diálogo sobre relações
humanas fosse ampliado e alguns importantes tópicos, como por exemplo: a
sexualidade, também entrasse para as discussões. Com isto, a igualdade de
tratamento entre sacerdotes de diferentes gerações, bem como a abertura de tais
religiões, para a realização de determinados estudos e registros de suas
histórias e culturas, passa á ser fato real, que considera o avanço das
religiões de matrizes africanas nas grandes cidades pautado pela notável vinda
dos africanos para o Brasil nos anos 90; a influência do inglês e do francês,
no dialeto iorubá e mais tarde, nos hábitos afro – descendentes que incorporam
por exemplo, o uso da tecnologia alheia; o respeito as relações de gênero e
orientação sexual e ao como este processo se dá no espaço sagrado e nas demais partes
da civilização ocidental cristã ou cristianizada, além da ampliação dos espaços
da comunidade Terreiro na América Latina como um todo; a Santeria, hoje, objeto
de estudos de acadêmicos e religiosos brasileiros e franceses, além de
perpetuação do culto de Orúnmilá – Ifá por meio das religiões Afro-americanas,
sobretudo em Chicago, permitindo uma maior e melhor troca de experiências e
conhecimento sobre tudo entre as lideranças de mesma etnia, o que viria a
representar uma descentralização do conhecimento geral, tão almejado por tantos
e, posteriormente garantir uma outra relação do individuo com seus pares e a
sociedade ampliada.
Esses dados são importantes para
se pensar nos avanços culturais das civilizações africanas e, mais tarde no
crescimento de seus descendentes nascidos no Brasil, sobretudo o povo de
Terreiro. Mas e agora, o que fazer?
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forte abraço!
Babalorixá Oríosè
Asé!
Fonte: revista africas
Foto: Casa de Oxumarê